segunda-feira, 24 de março de 2014

Vila dos Confins, de Mário Palmério

Esse me fisgou já pelo começo, com nosso herói Xixi Piriá andando solitário pela caatinga, carregando sua mochila abarrotada de utilidades para comércio, e sequer imaginando ser presenteado com um valioso punhal pelo deputado Paulo Santos, mais adiante na história. Engraçado que, em algum momento no passado, lembro de ter lido o capítulo de abertura sem muita atenção... tempos depois, foi exatamente uma nova leitura distraída das páginas que me prendeu e fez continuar.

Umas das coisas que me atraiu no livro foi a narrativa agradável, bem descritiva da região dos Confins, que é basicamente a caatinga árida -  que parece um outro mundo, inóspito e romântico, pelo menos do ponto de vista de um cara nunca viajado para fora do Sul.

O enredo, além de de contar as dificuldades da realização da primeira eleição na Vila dos Confins (traições, subornos, estratégias e peregrinações pelas estradas e vilarejos miseráveis) abre momentos muitos interessantes para "causos" contados pelos personagens, o que, imagino, tenha sido a maneira do autor de expandir sua descrição do mundo da caatinga, as pessoas e personalidades, o estilo de vida, humana e selvagem. Temos cobras, piranhas e onças, tudo num clima pescaria-e-cachaça e muita atenção aos truques e artimanhas da fauna, que luta pela sobrevivência e vez ou outra causa problemas aos vaqueiros e seus rebanhos, praticamente proporcionando o surgimento de lendas e contos fantásticos.

A narrativa de Mário Palmério é abundante em palavras e expressões regionais, tornando a leitura exigente para o leitor acostumado à um vocabulário mais simples; mas acredito que não atrapalhe a narrativa, bastando um pouco de interpretação e imaginação, tornando assim a leitura rica e diferenciada... em tempos de best-sellers acelerados, essa leitura é quase uma bizarrice. Mas enfim, eram outros tempos, outros autores e outra cultura. Um bocado de intelectualismo, disfarçado, e regionalismo, esse escancarado desde o começo.

Nenhuma citação por aqui, mas se fosse incluir, acho que seria do capítulo sobre os habitantes do garimpo, vivendo de rapadura, fumo e cachaça, em galpões miseráveis, mas absortos no peneirar das rochas, em busca de ouro, que uma hora ou outro, brilha no meio dos sedimentos do leito do rio.

E é isso! Vila dos Confins, de Mário Palmério. Desconfio que os escritos à caneta na primeira página sejam um autógrafo do próprio autor, o que não é de duvidar, se tratando de um livro da pequena biblioteca de meu pai, essa que já me forneceu tanta coisa e que ainda continuo explorando sem pressa com o passar dos anos - além de ir formando a minha própria, é claro.

Do mesmo autor, localizei ainda Chapadão do Bugre, que promete ser obra igualmente interessante, mas não sei se vou encarar essa sequência... tenho outros livros na fila, e no momento, estou indeciso diante dum monstrinho escrito por autor que já conheço, esse  difícil Umberto Eco.

No futuro, retorno à caatinga.

Nenhum comentário:

Postar um comentário